Em 2015, logo após nos mudarmos para Monterrey, México, a empresa do meu marido organizou uma conferência. O foco era a segurança das famílias estrangeiras, dado o histórico da violência ligada aos cartéis do narcotráfico. O evento ocorreu em uma manhã, em um conhecido hotel próximo ao maior shopping da cidade. Reunimo-nos no salão de conferências, onde os especialistas em segurança compartilharam dicas e medidas protetivas essenciais para nossa adaptação à cidade.
As informações não eram muito diferentes do que nós, brasileiros, já quase nascemos sabendo, principalmente eu, que cresci no Rio de Janeiro: ao se aproximar do carro estacionado, prestar atenção para ver se não há nenhum suspeito próximo; ao entrar no carro, dar a partida imediatamente, sem ficar dando bobeira no celular; quando vir o sinal fechado, reduzir o veículo aos poucos para evitar ser um alvo aguardando-o abrir, mas se parar for inevitável, manter distância com o veículo à frente, dando espaço uma manobra repentina; entre outros conselhos.
No intervalo fizemos um exercício prático. Fomos liberadas para passear pelo shopping, cientes de que profissionais treinados estariam nos seguindo, simulando uma situação real de possível ataque. Nossa meta era identificar quem eram as pessoas, e reconhecê-las ao voltar para o treinamento. Fui a única que conseguiu apontar o perseguidor, não por me considerar extraordinária, mas por ter crescido e sido treinada com a paranoia de viver em uma cidade violenta.
Essa inesperada “caçada” pelos corredores do shopping em Monterrey, além de me fazer sentir como uma verdadeira detetive, recordou-me de uma das mais intrigantes campanhas publicitárias do século XX, protagonizada por Lobby Lud, um personagem fictício criado pelo jornal britânico Westminster Gazette. Talvez tenham sido eles os pioneiros na arte de transformar o público em participantes ativos de uma narrativa.
Naquela época, o Westminster Gazette buscava uma alternativa para impulsionar suas vendas durante o período de férias, tradicionalmente marcado por quedas significativas. Inspirado pela comoção causada pelo desaparecimento de Agatha Christie no ano anterior, o jornal lançou uma inovadora campanha de marketing. Essa estratégia transformava os leitores em verdadeiros detetives. Assim, Lobby Lud fora apresentado como um “homem desaparecido” na edição do jornal de 30 de julho de 1927. Por trás da criação do personagem estava a inovadora leitura interativa, engajando as pessoas a comprarem os exemplares durante as férias e procurarem o senhor Lobby Lud pelos resorts à beira-mar, locais em que, de acordo com o jornal, ele havia sido visto.
A campanha de Lobby Lud não se limitava a simplesmente encontrar um homem misterioso; ela guiava os leitores para um mundo de pistas cifradas e encontros casuais, transformando as férias de verão numa aventura misteriosa. Leitores armados apenas com um jornal do dia e uma frase-chave tinham que estar sempre atentos, prontos para abordar um estranho com a esperança de que fosse o verdadeiro Lobby. Era um jogo que desafiava a percepção e a sagacidade, provando que qualquer um poderia assumir o papel.
Uma vez detectado, o suspeito era abordado com a frase: Você é o senhor Lobby Lud, eu reivindico o prêmio do Westminster Gazette. O valor aumentava a cada semana, caso Lobby permanecesse anônimo. A iniciativa não só aumentou as vendas do Westminster Gazette durante os meses de verão, como também deixou uma marca duradoura na cultura popular britânica, transformando a busca por Lobby Lud em uma tradição de verão. Em 1928, o Gazette encerrou as atividades, mas a campanha foi absorvida por outros jornais, agraciando os leitores por muitas décadas com a brincadeira detetivesca.
Embora ocorrida em circunstâncias bem diferentes, minha experiência em Monterrey fez soar a essência da aventura criada pelo Westminster Gazette, quase um século antes. A conexão existente ressalta o poder atemporal das narrativas interativas, capazes de transformar leitores em detetives, sendo em trama de suas próprias vidas, nas das páginas de um jornal ou de um livro. A iniciativa envolvendo o personagem fictício Lobby Lud me faz entender que a busca por engajamento não tem limite de tempo. No mundo de hoje, tão saturado de informações e distrações, a capacidade de envolver, surpreender e unir as pessoas através de histórias continua sendo uma ferramenta valiosa.
Ao refletir sobre ambas aventuras fica evidente que a curiosidade, o desafio e o prazer de solucionar enigmas são, invariavelmente, os motores que impulsionam os aficionados por histórias policiais, não importando o contexto ou a época.